segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

o faroleiro - I

Bem que as ondas podiam bater com mais suavidade nessas pedras, como pequenas volutas de um mar tranquilo.
O barco segue desequilibrando-se na linha fina do horizonte, de longe avisto apenas suas luzes trêmulas. Do outro lado: a boca enorme de um monstro - não é o que vejo daqui até porque a escuridão impossibilita a percepção de qualquer coisa além das duas pequenas luzes da embarcação. Há diversos relatos que dão conta de um dragão que sobrevoa no lado do que não é visto, na quebrada do futuro, lá para o assombro. Os marinheiros quando retornam estão todos com um tom de pele do tipo de quem sofre ou sofreu com fogo. Da boca grande do dragão indomável, inominável, de um tipo que vive e que ninguém nunca viu, no lado de lá do lado, no quedar dos olhos na linha de sombra.
Numa breve estiagem o vento faz mais força e joga água salgada contra a proa, o barco ameça virar ao contrário, efetuar um rodopio, mas a rede de arrasto segura firme a popa na superfície da água. A chuva volta, os relâmpagos revelam o vulto da serpente alada.
Hoje, antes do início da tempestade, enquanto ainda havia calmaria e o barômetro predizia o pior, a energia elétrica foi cortada. Houve algum problema no gerador e o farol não está iluminando - sou o faroleiro – já telegrafei ao meu supervisor no continente. Assisto tudo da janela do meu quarto, sem nada poder fazer além do que já foi feito.


3 comentários:

Adriana Godoy disse...

Rafael, pois é, vim aqui e li o que não tinha lido e me deliciei como sempre. Beijo, moço!

Aline Miranda disse...

ah, que ótimo! vou acompanhar o relato.
Um beijo!

Jonas. disse...

Nossa, Rafael. Achei lindo isso!!!!!

raso

qual atalho, uma curva pro caminho do sossego - mas no fundo é raso; água bate no joelho nada - não é nada nunca foi tão fácil contud...