sábado, 24 de janeiro de 2009

Big Bang

Por uma hora revirou-se na cama de um lado para o outro. Aceitando a derrota para a insônia, abriu os olhos. Viu as luzes da rua que se projetavam no teto. Sentiu fome.

Levantou. Sem acender a luz do quarto se dirigiu à cozinha. Pegou duas bananas do tipo prata, o pacote de aveia, um prato, o pote de açúcar e um garfo. Não compreendia, jantara há pouco - sua dúvida não levava a nada, era uma exigência do seu organismo. Depois de amassar a banana com o garfo, jogou o cereal, adoçou; exatamente nessa ordem. Antes de comer levou as cascas à lixeira. Ao terminar percebeu que a dor persistia. Deixou o prato e o talher na pia e recorreu à geladeira. Tomou um resto de suco de manga.

Quando já se preparava para escovar os dentes, fisgada. Fome. Fome. Fome. Desta vez com mais força e presença. Largou a escova de dentes sobre o sofá, olhou para o lado e verificou sobre a mesa um pacote de pães franceses. Retirou um pedaço. Mastigou. Mastigou. Engoliu e esperou. Pegou a parte que sobrou do pedaço anterior. Mastigou, mastigou, mastigou. Havia mais três pães, devorou todos. A barriga latejava querendo mais. Novamente abriu a geladeira e não encontrou qualquer coisa que pudesse servir de alimento; estava vazia, vazia. Do local que estava pode avistar a estante de livros na sala; caminhou atônito para lá.

Pegou um romance ao léu, literatura brasileira. Abriu, arrancou a primeira página, fez uma pequena bola e engoliu. Sentiu as palavras roçando a garganta. Aos poucos os livros foram sendo retirados e devorados. Suas capas ficavam como cascas espalhadas pelo chão. Passou do conjunto de obras literárias nacionais, à estrangeira, em seguida vieram os de arte, filosofia e antropologia. Não havia mais nenhum livro inteiro, deglutiu as capas. E o vazio latente. Comeu as revistas, os jornais velhos - na verdade todos os jornais são velhos. Não havendo mais nada de papel, experimentava agora os tecidos; todas as roupas e toalhas. Nenhum sinal de melhora. Tinha medo de que fosse um apetite maior que o mundo. Sentia um mostro o devorando pelo interior, era uma fome de dentro de dentro dele e para fora - uma gula voraz.

Quando já estava a raspar as paredes, lembrou do pacote de pães; encontrou-o amassado e jogado no pavimento - não havia mais mesa, nem outros objetos além dessa embalagem. O lar era agora umas paredes raspadas e piso. Embicou o pacote na boca e deixou escorrer o farelo goela a dentro.
Sentiu-se saciado.

Após um piscar de olhos percebeu a casa nua. Todo o peso daquilo tudo que havia preenchia-o por dentro. As primeiras buzinas do dia já se manifestavam juntamente com os apitos do guarda de trânsito.
Aconchegou-se num canto e dormiu. Sonhou que sonhava e nesse sonho tinha fome.

Depois de comer a casa, passou para o bairro, depois o município, em seguida o estado, partiu para o país e finalizou colocando o mundo para dentro de si.
Tinha medo de que fosse um apetite maior que o mundo. E era. Engoliu o universo; as galáxias faziam cócegas e davam pigarro. Cada vez que tossia provocava tempestades solares.


2 comentários:

Juliana (A Tuca!) disse...

Ameeeeei!!!!
Ri mto!!!!

Imagina o arroto, hein?!

Tipo os do Baby, da Família Dinossauro! rs!

Bjsss

Saudade de tu, tatu!

Julia D disse...

Me lembrou o bom e velho João Cabral..."o amor comeu meus documentos, meus cartões de visita", etc...sabe?

Fome é foda!

bj
J.

raso

qual atalho, uma curva pro caminho do sossego - mas no fundo é raso; água bate no joelho nada - não é nada nunca foi tão fácil contud...